MEDICINA AEROESPACIAL

ALTERAÇÕES EM VÔOS



 

Problemas de saúde em voos comerciais são relativamente infrequentes. Um trabalho realizado na British Airways no final da década de 90, demonstrou uma taxa de aproximadamente 1 emergência médica a cada 10.000 passageiros.

70% dessas emergências são controladas pela tripulação de bordo que recebe treinamento especial. Apenas 30% necessitam de assistência médica em solo.

É importante conhecer as alterações ambientais das cabines dos aviões, para entender porque algumas emergências acontecem.

Níveis de oxigênio - Que a cabine é pressurizada, todo mundo sabe. Mas o que muitos desconhecem, é o fato de que esta pressão não é igual a do nível do mar. Quando os aviões atingem sua altura de voo máxima, por volta de 13.000 metros ou 40.000 pés, a pressão atmosférica da cabine é equivalente a de 2500 metros de altura. É como se, enquanto o avião ganha altitude, nós estivéssemos subindo as cordilheiras. A pressão de oxigênio é semelhante ao que temos nessas alturas.

Pessoas normais não sentem a diminuição do oxigênio porque o nosso corpo compensa essa falta de O2 com aumento da frequência cardíaca, da frequência respiratória e do volume de ar inspirado em cada ciclo respiratório. Porém, mesmo com toda essas alterações, a saturação de oxigênio sanguíneo que costuma ser de 99% ao nível do mar em pessoas normais, cai para 94% durante os voos. Isto tudo em pessoas em repouso, que é o estado de quem viaja de avião.

Não é incomum pessoas idosas ou fumantes inveterados apresentaram algum grau de desconforto e cansaço durante voos longos.

Pessoas com doenças cardíacas ou pulmonares, que já apresentam taxas de saturação de O2 menores que 95% , podem não conseguir compensar essa diminuição de oxigênio e apresentar queda da oxigenação arterial para abaixo dos 90%, taxa insuficiente para o bom funcionamento dos órgãos. Nesse momento podem surgir sintomas de isquemia cardíaca como palpitações, intensa falta de ar e dor no peito (angina).

Pressão atmosférica - A baixa pressão atmosférica dentro das cabines provoca uma expansão dos gases de até 30% do seu volume. Todas as nossas cavidades ocas se expandem. Por isso sentimos o ouvido entupido durante os voos. Pessoas com otite ativa, lesões recentes nos tímpanos ou sinusites, podem apresentar rompimento da membrana timpânica durante o voo.

Essa expansão também pode ocasionar efeitos em outras partes do corpo, como
pneumotórax em pessoas com doença pulmonar, distensão abdominal e náuseas por dilatação do estômago e do intestino.

Por isso, pessoas com cirurgia pulmonar ou abdominal recente não devem viajar de avião. Existe um risco de rompimento das suturas.

Qualidade do ar - A umidade do ar dentro da cabine é de apenas 10-20%, quando o ideal é no mínimo de 40%. Essa baixa umidade, além de facilitar a desidratação, resseca a pele e as vias aéreas, podendo desencadear crises em pacientes com asma ou enfisema/bronquite crônica.

Transmissão de germes pelo ar - Os sistemas de ventilação de ar dos aviões são capazes de manter sempre baixa as contagens de bactérias, fungos e vírus no ar. Porém, como se trata de um ambiente fechado, com pessoas muito próximas e muitas vezes durante várias horas, existe sempre o risco de transmissão de doenças. Existem relatos de transmissão de tuberculose, gripe, catapora (varicela), rubéola e gripe asiática durante os voos. Normalmente o contágio ocorre no voo, mas os sintomas só surgem quando já se está em terra.

Outros problemas - Algumas pessoas apresentam náuseas devido aos constantes balanços e principalmente às turbulências, que também podem causar traumatismos por quedas. Intoxicação alimentar também já foi descrita algumas vezes.

Quando existe algum passageiro com queixas referentes a saúde, o capitão da aeronave deve ser logo informado. O primeiro procedimento é localizar algum médico ou profissional da área que por ventura esteja a bordo para avaliação do caso. Em 60% a 70% dos casos existe um médico entre os passageiros.

A decisão de se interromper o voo ou mudar a rota é sempre do piloto, cabendo ao médico apenas uma opinião. O capitão toma a decisão baseado no peso do avião, condições climáticas, distância do destino, capacidade do aeroporto mais próximo de receber a aeronave etc... Mesmo em condições ideias são necessários pelo menos 20 minutos para aterrisar um avião.

O médico não tem poder de decisão nenhum em relação a aeronave.

Sempre que possível o piloto reduz sua altitude de voo para uma melhor oxigenação da cabine em caso de emergência médica.

Enquanto são tomadas as decisões sobre o voo, o médico tem ao seu dispor o material básico para emergência que inclui:

- Drogas como adrenalina, atropina, anti-histamínicos, aspirina, antiarrítmicos, broncodilatadores, analgésicos e soro fisiológico.
- Materiais como : agulhas, gases, seringas, estetoscópio, aparelhos de pressão e luvas
- Equipamentos de ressuscitação como o desfibrilador, máscara de ambú, balas de oxigênio e material para entubação traqueal.

As principais complicações são as cardiológicas. 50% dos voos interrompidos são por queixas dessa origem, muitas precipitadas pelo baixa pressão de oxigênio na cabine. As crises de angina, que é a dor no peito por isquemia cardíaca, são as principais queixas.

Uma das complicações, que apesar de rara, tem ganhado muito espaço na mídia é a chamada síndrome da classe econômica. Esta síndrome ocorre por trombose (entenda o que são trombos e êmbolos no texto sobre
AVE) das veias da perna que passam a ser fonte de êmbolos para o pulmão, podendo ocasionar o TEP (tromboembolismo pulmonar).

Já reparam como após voos longos, os pés e as pernas ficam inchados? Quem é que nunca teve dificuldade para calçar os sapatos depois de uma longa viagem? Isso ocorre porque quando ficamos muito tempo sentado, dificultamos o retorno do sangue pelas veias, e este começa a ficar represado nos membros inferiores. Esta dificuldade ocorre mesmo em pessoas sem doenças dos vasos.

Se já é mais difícil o retorno do sangue em pessoas normais, naquelas que têm doença dos vasos, ocorre uma estase tão importante do sangue que propicia a formação de coágulos. Portanto, a trombose das pernas e o TEP ocorrem em pessoas que já apresentam problemas de circulação dos membro inferiores, principalmente varizes muito desenvolvidas. Pode acontecer também em pacientes que tenham alguma doença sanguínea que facilite a coagulação. Esta complicação ocorre geralmente em voo maiores que 8 horas, em pessoas desidratadas e que ficam a viagem inteira sentada.

Alguns conselhos devem ser seguidos:

- Não fumar
- Beber bastante líquido durante a viagem
- Movimentar-se dentro do avião a cada 2 horas
- Evitar roupas muito apertadas
- Evitar álcool e sedativos para que não se fique em uma mesma posição durante muito tempo
- Usar meias compressoras

Mdsaude