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O cateter de Swan-Ganz deve ser indicado em todo paciente de terapia intensiva?

    SOCESP - SOCIEDADE DE CARDIOLOGIA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ELIAS KNOBEL, NELSON AKAMINE, CONSTANTINO JOSÉ FERNANDES JÚNIOR

 

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia

INTRODUÇÃO

A introdução, por Swan e Ganz(1), de um cateter que permitia o registro de parâmetros hemodinâmicos na artéria pulmonar a partir de 1970 revolucionou o tratamento de pacientes graves. Esse cateter, dispondo de um balão situado em sua extremidade, poderia ser inflado e, dessa forma, ser dirigido pela corrente sanguínea por meio das válvulas tricúspide e pulmonar, atingindo a circulação pulmonar. Com esse mesmo cateter foi possível medir o débito cardíaco, pela técnica da termodiluição, a partir de 1972. O conhecimento de parâmetros fisiológicos, que até então só eram obtidos em laboratório de hemodinâmica, tornou-se acessível à beira do leito, permitindo o tratamento mais racional dos estados de choque, infarto do miocárdio, insuficiência respiratória aguda, quadros sépticos e outras condições que ocorrem nos pacientes graves.
A introdução desse método na prática clínica rotineira exigiu do médico intensivista a necessidade de considerar conceitos fisiológicos e fisiopatológicos para planejar o tratamento dos pacientes graves. Os anos 70 foram considerados os "anos dourados" das drogas inotrópicas, que foram utilizadas de forma mais adequada com o auxílio do cateter de Swan-Ganz.
Na década de 1980, o uso do cateter de Swan-Ganz cresceu rapidamente, de 400 mil para 2 milhões de unidades vendidas anualmente em todo mundo (1 milhão só nos Estados Unidos, com custo estimado em US$ 2 bilhões)(2). Por outro lado, no Reino Unido calculou-se que em 1994 eram utilizados de 6 mil a 8 mil cateteres anualmente, 40 vezes menos que nos Estados Unidos(3).
Atualmente existem diversas modalidades desse cateter e de técnicas associadas que propiciam medidas contínuas da SvO2, da fração de ejeção do ventrículo direito e do débito cardíaco, nos pacientes internados nas unidades de tratamento intensivo de todo o mundo.
Apesar de todos os avanços obtidos, a consolidação científica do benefício na utilização desse cateter encontrou obstáculos pela ausência de estudos prospectivos e randomizados, visto que sempre foi considerado não-ético deixar de oferecer esse recurso para um paciente grave que eventualmente pudesse necessitá-lo.

ABORDAGEM DO PACIENTE GRAVE

Todo paciente admitido numa unidade de tratamento intensivo é submetido a um conjunto de processos seqüenciais que obedecem a um princípio lógico, visando sua melhor recuperação. O algoritmo básico é constituído por: 1) suporte vital básico; 2) correção de fatores precipitantes; 3) suporte vital avançado; 4) suporte a falências orgânicas; e 5) tratamento de complicações e intercorrências. Após o suporte vital básico e a correção de fatores precipitantes, instituem-se as medidas de suporte vital avançado: suporte ventilatório e de oxigenação associado ao suporte hemodinâmico. O controle hemodinâmico constitui-se, portanto, numa das tarefas iniciais e mais importantes na assistência aos doentes graves(4, 5).
Existe nítido paralelismo histórico entre o conhecimento da fisiopatologia, a evolução tecnológica, a aplicação da epidemiologia clínica e os protocolos de suporte hemodinâmico. Como resultado dos conhecimentos de laboratórios experimentais de hemodinâmica surgiram os princípios iniciais que norteiam o suporte hemodinâmico. Normalizar a pressão arterial, a freqüência cardíaca, o fluxo urinário e a perfusão periférica foram inicialmente consideradas as metas da reposição volêmica e suporte inotrópico. Esse conhecimento, derivado de modelos em que havia fluxo sanguíneo lentificado (choque hemorrágico/choque hipovolêmico/choque cardiogênico), provavelmente propiciou bons resultados para diversas doenças. Quando a medida da pressão venosa central tornou-se rotineira, alguns dos pacientes considerados refratários ao tratamento mostravam, na verdade, hipovolemia insuspeitada. Os protocolos de acompanhamento da reposição volêmica com medidas seqüenciais da pressão venosa central fizeram parte da cultura médica dos anos 60 e 70. Com o decorrer dos anos as unidades de tratamento intensivo passaram a ser ocupadas de forma crescente por pacientes que apresentavam quadros hemodinâmicos diversos, que não se comportavam como os modelos animais clássicos de hipofluxo sanguíneo. Pacientes politraumatizados(6), sépticos(7, 8), com processos inflamatórios importantes mostravam um padrão de hiperfluxo sanguíneo. Esse padrão hiperdinâmico foi identificado primeiramente em humanos, por meio do cateter de Swan-Ganz. Somente depois é que foram desenvolvidos modelos animais capazes de simular tal condição hemodinâmica. A capacidade do exame clínico em aferir corretamente variáveis hemodinâmicas, com essa maior diversidade de padrões, mostrou-se muito ruim(4). Como a mortalidade dos pacientes aparentemente não se reduzia com os protocolos feitos inicialmente, adotou-se outro modelo fundamentado em razões lógicas. A normalização dos parâmetros hemodinâmicos não é suficiente para melhorar a sobrevida, porque a demanda metabólica de oxigênio é maior que os valores normais. Os protocolos de suporte passaram a ser guiados, então, por variáveis que atestam o atendimento das necessidades metabólicas. As metas passaram a ser a correção da acidose láctica e o aumento da oferta de oxigênio enquanto o consumo fosse aumentando paralelamente, constituindo-se na chamada "terapia supranormal" dos anos 80(9). Como o exame clínico é impreciso e como as variáveis só podem ser obtidas de forma invasiva, existiu grande pressão para que muitos pacientes fossem monitorizados com o cateter de Swan-Ganz. A monitorização rotineira com cateter de Swan-Ganz foi capaz de revelar enorme conjunto de conhecimentos hemodinâmicos e metabólicos insuspeitados até então, motivando a criação de diversas linhas de pesquisa experimental. Finalmente, os anos 90, com a nova abordagem da epidemiologia clínica que enunciava os princípios da Medicina Baseada em Evidências, trouxeram uma visão mais estruturada do problema e um direcionamento mais correto para sua solução. A terapia guiada por padrões hemodinâmicos deve ter bases fisiológicas racionais e sua efetividade deve ser verificada com estudos randomizados controlados, com casuística suficiente para ter o poder de aferir o benefício clínico. A maioria dos conhecimentos que temos sobre quadros hiperdinâmicos foi derivada do uso do cateter de Swan-Ganz e boa parte dos estudos em laboratório e experimentos animais foi motivada por problemas identificados na prática clínica de suporte hemodinâmico a pacientes sépticos. No entanto, mais do que racionalidade, busca-se comprovação de eficiência.
Nesse cenário atual de tecnologia sofisticada e custos elevados, podemos concluir que a abordagem do paciente crítico está sendo reavaliada. A apreciação completa da literatura médica sobre o assunto, tratada sob a forma de meta-análise, é altamente desejável para que se possa ter juízo claro daquilo que já foi explorado adequadamente e das perguntas a serem respondidas em estudos futuros. Este trabalho expõe algumas conclusões possíveis, respeitando-se critérios metodológicos adequados, raciocínios fisiopatológicos conhecidos e ressaltando alguns aspectos práticos oriundos da experiência em cuidados à beira do leito.
Logo após a introdução do cateter de Swan-Ganz, alguns estudos foram realizados com o intuito de avaliar essa nova técnica em vários grupos de pacientes graves, porém somente alguns procuraram estabelecer seu efeito na sobrevida. Shoemaker e colaboradores(10), em seu estudo prospectivo em pacientes cirúrgicos de alto risco, verificaram que complicações, duração da internação hospitalar, uso de ventilação mecânica, assim como custos e taxa de mortalidade pareciam estar reduzidos quando o cateter era inserido no pré-operatório e utilizado na otimização das variáveis circulatórias. Tuman e colaboradores(11) estudaram prospectivamente os efeitos da monitorização pelo cateter de Swan-Ganz em oposição à monitorização da pressão venosa central em 1.994 pacientes consecutivos submetidos a cirurgia de revascularização do miocárdio. Não foram encontradas diferenças significativas em relação a tempo de hospitalização, ocorrência de infarto pós-operatório, e mortalidade hospitalar. Berlauk e colaboradores(12) estudaram prospectivamente o uso do cateter em pacientes submetidos a cirurgia vascular periférica, tendo encontrado menos eventos adversos intra-operatórios, menor taxa de trombose no enxerto e menor morbidade. A despeito disso, não puderam demonstrar redução no tempo de internação ou na taxa de mortalidade quando o cateter foi usado na otimização dos cuidados.
A forma convencional de monitorização do choque falha freqüentemente em detectar a inadequação da perfusão tissular, o que poderia levar à ressuscitação incompleta, culminando em aumento da morbidade e da mortalidade. Existem evidências consistentes com a hipótese de que o aumento do transporte de oxigênio no paciente grave poderia reduzir a mortalidade. Existem, até agora, onze estudos clínicos randomizados e controlados, conflitantes em relação ao mérito de se aumentar o transporte de oxigênio a níveis supranormais. Quatro desses estudos documentaram que o incremento no transporte de oxigênio era capaz de reduzir a mortalidade em pacientes cirúrgicos de alto risco(6, 9, 10, 13). Em oposição, os seis restantes não puderam documentar diferenças significativas na mortalidade quando o transporte de oxigênio foi maximizado em portadores da síndrome do desconforto respiratório agudo(14), em pacientes graves(15, 16), em portadores de choque séptico(17), em politraumatizados(18), em cirurgia vascular periférica(12) e, por fim, aumento da mortalidade em pacientes graves submetidos a terapêutica supranormal(19).

AVALIAÇÃO CLÍNICA

O choque foi definido por Blalock, em 1922, como falência da perfusão tissular. A partir de 1970, o emprego do cateter de Swan-Ganz propiciou a monitorização "à beira do leito" de parâmetros hemodinâmicos relacionados à circulação pulmonar e sistêmica, ampliando, dessa forma, os recursos diagnósticos e de orientação terapêutica à disposição do médico intensivista.
A avaliação de outros parâmetros cardiocirculatórios, tais como a função ventricular, podem ser obtidos por meio da Medicina Nuclear, da ecocardiografia, da tomografia computadorizada, da ressonância magnética, de medidas do dp/dt durante o ciclo cardíaco, assim como com radiografias, enzimas e outros testes laboratoriais rotineiros. Da mesma forma, a função pulmonar pode ser avaliada com auxílio da cintilografia com tecnécio, da tomografia computadorizada, da ressonância magnética, da difusão de monóxido de carbono, assim como com a determinação padrão dos gases arteriais, cálculos do "shunt" e das complacências estática e dinâmica do parênquima pulmonar.
Esses métodos sofisticados de avaliação das funções pulmonar e cardíaca freqüentemente fornecem informações mais fidedignas do que as simples avaliações clínicas, subjetivas e imprecisas, da perfusão tissular. A observação clínica isolada numa população de doentes graves tem baixa correlação com os parâmetros hemodinâmicos medidos(20). Em pacientes com choque séptico, mesmo antes do advento da monitorização hemodinâmica "à beira do leito", foram documentadas as baixas sensibilidade e especificidade de parâmetros que avaliam a perfusão periférica por meio do exame clínico (temperatura cutânea, sensório e débito urinário) em relação à medida do índice cardíaco por meio do cateter de Swan-Ganz(21).
Em pacientes com infarto agudo do miocárdio, a experiência inicial de Forrester e colaboradores(22), em 1976, identificou quatro subgrupos hemodinâmicos com implicações prognósticas(22). Naquele estudo preliminar o achado de terceira bulha e/ou presença de estertores pulmonares associados a evidências de hipoperfusão periférica enquadrariam o paciente no grupo de maior mortalidade, o do choque cardiogênico, correspondendo a índice cardíaco menor que 2,2 l/min.m² e a pressão capilar pulmonar maior que 18 mmHg. Os mesmos autores, em estudo posterior, reconsideraram essas posições ao documentar que cardiologistas "senior" foram incapazes de predizer se a pressão capilar pulmonar estaria maior ou menor do que 18 mmHg em 68% das tentativas. De forma mais evidente, verificaram que 30% dos pacientes com pressão capilar pulmonar maior que 18 mmHg não apresentavam estertores à ausculta pulmonar, enquanto 35% daqueles com pressão capilar pulmonar menor que 18 mmHg apresentavam esse achado propedêutico. Identificaram também a presença de terceira bulha em 50% dos pacientes na fase aguda do infarto agudo do miocárdio, independentemente do valor aferido da pressão capilar pulmonar(23, 24). Nossa experiência é bastante ilustrativa ao documentar que 25% dos pacientes com diagnóstico clínico de choque cardiogênico e que foram submetidos à monitorização hemodinâmica invasiva "à beira do leito" apresentavam-se apenas hipovolêmicos(25).
Diversos estudos, testando o exame clínico no ambiente de terapia intensiva, atestam que o intensivista é incapaz de predizer corretamente variáveis como débito cardíaco, pressão capilar pulmonar ou resistência vascular sistêmica em mais de 50% das vezes(4). Ressalte-se que o conhecimento das variáveis hemodinâmicas exigiu alterações no planejamento terapêutico em pelo menos 50% dos pacientes e que a experiência do intensivista não influiu na capacidade de predição(21, 22).
Fica claro que é no paciente grave, portador de falências orgânicas múltiplas e com índice de mortalidade freqüentemente superior a 80%, que a avaliação clínica isolada é insuficiente, por maior que seja a experiência do intensivista. Ainda que o cateter de artéria pulmonar permita melhor determinação hemodinâmica e a estratégia terapêutica possa ser alterada, isso não prova que o conhecimento desses dados e a alteração terapêutica possam melhorar o prognóstico global. Porém nos parece lógico assumir que a melhora da acurácia diagnóstica propicie diagnóstico mais precoce e correto, reduzindo a morbidade e eventualmente melhorando a sobrevida. Para que tal ocorra é importante uma abordagem clínica global: os pacientes a serem monitorizados precisam ser cuidadosamente selecionados, seus processos fisiopatoló-gicos precisam ser identificados, a necessidade da terapêutica deve ser apreciada, e precisa ser adotada e administrada adequadamente uma forma específica de estratégia. Para tanto, o cateter deve ser inserido corretamente, fornecer dados confiáveis para que o médico assistente esteja munido de dados suficientemente sensíveis e possa orientar a terapêutica em benefício do paciente como um todo e não para funções orgânicas isoladas.

O CATETER DE SWAN-GANZ E OS MÉTODOS NÃO-INVASIVOS

O cateter de Swan-Ganz propicia bom sistema de monitorização? Para que se possa estabelecer alguma comparabilidade entre dois métodos, torna-se necessário o estabelecimento de alguns pontos fundamentais: Qual a variável que estará sendo estudada? Qual é o método considerado "gold standard" para aferir a variável? Após o estabelecimento desses dois itens, as características ideais de um monitor devem ser aferidas: a) o equipamento deve ser de fácil inserção e com baixo índice de complicações; b) deve fornecer dados seguros dentro do contexto clínico adequado; c) a variável deve ser aferida preferencialmente de forma direta e não por cálculos; d) os dados fornecidos pelo equipamento não podem ser obtidos de maneira menos invasiva ou de menor custo; e) os dados devem ser de fácil interpretação, podendo ser utilizados por muitos profissionais; f) o sistema de monitorização deve ser preferencialmente contínuo; g) o sistema deve ser capaz de sugerir mudanças no tratamento; h) as mudanças na terapêutica devem produzir mudança no prognóstico.
Diversos trabalhos procuraram elucidar alguns desses itens(26). A busca de referências bibliográficas com o termo "Swan-Ganz catheter" ou "pulmonary artery catheter" no banco de dados MedLine, entre 1970 e 1996, revela apenas 1.688 publicações. É um número supreendentemente pequeno quando comparado ao volume total de publicações médicas, que atinge a ordem de dois milhões por ano, nos anos 90. É de se esperar, portanto, que a maioria das perguntas sobre o assunto não tenha sido respondida adequadamente até o momento. A pesquisa associada dos termos "Swan-Ganz catheter" ou "pulmonary artery catheter" com "meta-analysis" não encontra nenhuma publicação até Janeiro de 1997.
O cateter de Swan-Ganz tem sido comparado a alguns métodos de monitorização alternativos, tais como a ecocardiografia, a bioimpedância elétrica torácica e a diversas formas de estudo radioisotópico. Existem poucas publicações sobre bioimpedância elétrica torácica, atingindo somente 113 em língua inglesa. Ao contrário, as publicações sobre ecocardiografia são volumosas, totalizando 37.776 referências, das quais 2.116 abordam a ecocardiografia contínua "à beira do leito".
A totalidade das análises comparativas é de validade reduzida, procurando freqüentemente ressaltar os benefícios da não-invasividade e deixando de abordar a totalidade dos aspectos.
A bioimpedância elétrica torácica tem a vantagem de ser um método não-invasivo, isento de complicações e de fornecer dados de forma contínua. Porém, a bioimpedância elétrica torácica superestima débitos muito baixos e subestima débitos muito altos, podendo constituir-se em método falho para o contexto da terapia intensiva, onde a importância da monitorização é maior quando os valores do débito cardíaco encontram-se em seus extremos. A aferição pelo cateter de Swan-Ganz do débito cardíaco na presença de insuficiência tricúspide ou hipotermia é muito falha e de forma semelhante a bioimpedância elétrica torácica pode falhar na presença de fibrilação atrial ou doenças cutâneas do tórax.
Podemos concluir preliminarmente que, nas condições atuais, o débito cardíaco deva ser aferido pela termodiluição. Caso a bioimpedância elétrica torácica seja corrigida na sua dificuldade em estimar débitos cardíacos em valores extremos e na presença de arritmias (achados muito freqüentes em pacientes graves), sua utlização seria altamente recomendada, visto que se constitui num método associado a menor invasividade, maior facilidade na instalação e possivelmente menor custo.
Essa análise, restrita ao débito cardíaco, não é suficiente para termos um juízo global dos dois métodos, visto que podem fornecer informações adicionais: o cateter de Swan-Ganz fornece pressões (atrial direita, ventricular direita, arterial pulmonar e pressão capilar pulmonar) e oximetria venosa mista contínua (nos equipamentos mais modernos); a bioimpedância elétrica torácica pode fornecer o índice de fluido torácico e estimativas dos volumes sistólico e diastólico do ventrículo esquerdo. Como essas variáveis não são comuns aos dois métodos, seria necessário repetir essa mesma análise já executada com relação ao débito cardíaco, comparando-se cada uma das variáveis aos respectivos "gold standard". A investigação de qual dos métodos (somando-se os efeitos das diversas variáveis medidas) teria maior impacto prognóstico em terapêutica guiada poderia permitir a eleição de um método ideal para determinado contexto clínico.
Portanto, devemos concluir que os estudos comparativos do cateter de Swan-Ganz com outras formas menos invasivas de monitorização ainda não foram elaborados de forma adequada. Respeitando-se os critérios acima enunciados, não existe uma análise comparativa adequada entre Swan-Ganz, ecocardiografia, bioimpedância elétrica torácica, radioisótopos, ou qualquer outro método(27).

INDICAÇÕES

O cateter de Swan-Ganz, inicialmente preconizado por seus idealizadores como um recurso que seria utilizado principalmente em laboratórios de experimentação e de pesquisa clínica, rapidamente passou a ser utilizado e com grande freqüência na prática diária das unidades de tratamento intensivo. Até há pouco tempo pudemos testemunhar que a maioria dos serviços não dispunha dessa técnica, principalmente nos países menos desenvolvidos. Por outro lado, em centros mais adiantados, algumas unidades de tratamento intensivo indicavam o cateter de Swan-Ganz de forma exagerada, como, por exemplo, rotina nos pós-operatórios de cirurgia cardíaca.
A monitorização hemodinâmica invasiva deve ser indicada somente quando alguma decisão de diagnóstico e conduta estão sendo consideradas e quando o intensivista estiver comprometido em atuar a partir dos dados obtidos com o procedimento. Essa indicação deve levar em conta obrigatoriamente que os dados obtidos contribuirão para a decisão terapêutica, sem acarretar risco desnecessário ao paciente.
As indicações com o intuito de se obter mais informações, ou como rotina do serviço para certos tipos de situações clínicas e outras menos específicas, não são justificativas para procedimento invasivo, que pode ter complicações, trazer algumas inconveniências ao paciente, além do custo. Algumas das indicações mais comuns estão listadas na Tabela 1.

Tabela 1. Indicações mais comuns para a monitorização hemodinâmica invasiva.

Para diagnóstico complementar ou diferencial
Comunicação interventricular X insuficiência mitral aguda no infarto agudo do miocárdio
Edema pulmonar cardiogênico X não-cardiogênico
Tromboembolismo pulmonar — hipertensão pulmonar
Elucidação diagnóstica
Para auxiliar no manuseio de situações clínicas complexas e instáveis, nas quais o conhecimento das pressões intravasculares e as medidas de fluxo podem orientar o tratamento
Condições cardíacas complexas:
— Infarto agudo do miocárdio complicado por:
1) hipotensão arterial que não responde à prova de volume;
2) instabilidade hemodinâmica que requer o uso de drogas vasoativas e suporte circulatório mecânico-choque cardiogênico;
3) hipotensão arterial e insuficiência cardíaca;
4) casos especiais de infarto agudo do miocárdio do ventrículo direito.
— Situações especiais de angina instável complicada, que requer uso de nitroglicerina por via endovenosa e outras drogas vasoativas
— Pacientes com edema pulmonar cardiogênico, não-cardiogênico, ou ambos
— Situações especiais em que a volemia e o desempenho cardíaco são incertos e nos quais a prova de volume e o uso de diuréticos poderiam ser prejudiciais ou trazer informações equivocadas — terapia guiada pela pré-carga e pela pós-carga
Pacientes críticos selecionados, que freqüentemente desenvolvem disfunção cardíaca no decorrer da internação:
— Sepse, síndrome séptica, síndrome da resposta inflamatória sistêmica, choque séptico e síndrome da disfunção de múltiplos órgãos
— Síndrome do desconforto respiratório agudo — reposição volêmica e ajuste de ventilador (PEEP e outros parâmetros)
— Pancreatite aguda
— Insuficiência renal aguda
— Processos dialíticos complicados
— Casos selecionados de "overdose" por drogas tóxicas
Pacientes cirúrgicos selecionados:
— Cirurgia cardíaca: múltipla troca de válvulas (idoso), doença pulmonar grave associada, revascularização do miocárdio com baixa função ventricular, ressecção de aneurisma ventricular
— Cirurgia vascular: aneurisma dissecante, ressecção de aneurisma de aorta torácica e abdominal
— Cirurgias abdominais de grande porte
— Cirurgias ortopédicas extensas (idosos)
— Politrauma
— Queimado grave
— Manuseio de situações obstétricas especiais de alto risco: cardiopatas, toxemia, placenta prévia
— Ressecções prostáticas extensas (casos especiais)
Como coadjuvante para a monitorização cerebral
Investigações clínicas: avaliando efeitos de novos tratamentos, novos conceitos

Adaptado de Freesinger e cols.(28) e do "American Society of Anesthesiologists Task Force on Pulmonary Artery Catheterization"(29).

CONTRA-INDICAÇÕES

Desde que haja indicação racional para o uso do cateter de Swan-Ganz, as contra-indicações serão relativamente poucas. O julgamento clínico é fundamental para a indicação da monitorização hemodinâmica invasiva. Pacientes com comprometimentos neurológicos extensos e sem perspectiva de recuperação não devem ser monitorizados com o cateter de Swan-Ganz. A mesma consideração é válida para pacientes com neoplasias disseminadas e outras doenças graves com mau prognóstico(28, 29). Porém, a nosso ver, uma das contra-indicações para a realização da monitorização hemodinâmica invasiva é a falta de conhecimento, habilidade e preparo por parte do intensivista e da equipe responsável pelo procedimento. Iberti e colaboradores(3), após realizar questionário multicêntrico, concluiu que o conhecimento dos médicos intensivistas sobre o emprego do cateter arterial pulmonar era extremamente variável, comprometendo, dessa forma, a utilização mais adequada dessa técnica. A parte técnica deve ser de conhecimento de todos os membros do grupo que realizam a monitorização hemodinâmica, incluindo obrigatoriamente a equipe de enfermagem, que devem interpretar os dados obtidos e atuar de maneira uniforme.

COMPLICAÇÕES

A utilização do cateter está associada com diversas complicações em potencial. A freqüência é variável entre os relatos de caso e os artigos de revisão na literatura(4, 30). Os escassos trabalhos prospectivos de vulto têm relatado baixa morbidade associada ao procedimento.
A segurança depende fundamentalmente da obediência aos requisitos cognitivos e habilidades técnicas, supervisão experiente e atenção aos detalhes(28, 29).
As complicações podem ser divididas, conforme demonstrado na Tabela 2.
Hemorragia, formação de hematoma e embolização de placas ateroscleróticas são raras mas passíveis de seguir-se à inadvertida punção arterial. A persistência de artéria subclávia sangrante pode ser magnificada por distúrbio de coagulação inadvertido e justificar hemotórax em evolução. Em presença de punções arteriais, a pressão local é recomendada. Nesse caso, o acesso pela veia jugular interna passa a ser prioritário, pois também minimiza a ocorrência de pneumotórax, exigindo do médico sempre uma avaliação radiológica subseqüente à passagem.
Foram descritas lesões de estruturas adjacentes à rede vascular, tais como trauma de duto torácico, mormente quando se utiliza a veia jugular à esquerda, síndrome de Horner, e lesão de plexo braquial e nervo frênico(30).
A embolia gasosa felizmente é rara, mas potencialmente letal. Sua ocorrência em pacientes hipovolêmicos ou que estejam desenvolvendo grande trabalho respiratório pode ser antecipada e evitada, introduzindo-se o cateter em posição de Trendelenburg.
Arritmias são freqüentes na inserção e na remoção, sobretudo durante a passagem do balão pelo ventrículo direito. As ocorrências de extra-sistolia ventricular são as mais comuns, embora tenham sido descritos episódios de fibrilação ventricular, fibrilação atrial e vários distúrbios de condução (bloqueio de ramo direito, bloqueio atrioventricular total). Essas complicações podem ser minimizadas pela velocidade com que se atravessa o ventrículo direito com o balão insuflado.
Dificuldades na progressão do cateter podem ocorrer sobretudo em estados de baixo fluxo, podendo determinar eventuais posições aberrantes, com subseqüente lesão valvar, de músculos papilares e/ou cordas tendíneas. Localização pleural, peritoneal ou de veia cava inferior já foram relatadas. O auxílio da radioscopia pode ser solicitado sobretudo em estados de baixo fluxo, insuficiência tricúspide ou grandes cavidades ventriculares quando as manobras mais simples não foram suficientes: cabeceira elevada, decúbito lateral esquerdo e inspiração profunda.
A manutenção do cateter em posição na artéria pulmonar pode justificar infartos pulmonares, que podem ser evitados pelo posicionamento proximal do cateter, pela infusão contínua de solução heparinizada, e com o cuidado em não se manter o balão insuflado além do necessário(4).
A cateterização além de 72 horas e manipulações múltiplas aumentam a chance de colonização e a taxa de infecção relacionada ao cateter.
A complicação mais dramática talvez seja a perfuração da artéria pulmonar, cuja manifestação clínica é a hemoptise. O risco aumenta com idade avançada, hipertensão pulmonar, hipotermia e desvios na técnica de inserção. A manutenção do cateter em posição proximal, por meio de confirmação radiológica, e a insuflação lenta e cuidadosa do balão durante a leitura da pressão capilar pulmonar são medidas que podem evitar tão temida complicação.

REQUERIMENTOS TÉCNICOS E COGNITIVOS

O número de exigências técnicas e cognitivas em programa de treinamento em monitorização hemodinâmica vai variar com a aptidão do médico, a instituição em que esse treinamento se realiza e a infra-estrutura oferecida(28, 29, 31). Vinte e cinco é o número mínimo de procedimentos requeridos para que um operador independente adquira competência. Esse número representa um consenso entre os especialistas consultores.
As exigências técnicas e cognitivas estão explicitadas nas Tabelas 3 e 4.

CONTROLE DE QUALIDADE

Nos anos 80 as modernas técnicas de administração e qualidade total foram aplicadas ao controle de procedimentos médicos. Nem todas as técnicas puderam ser aplicadas, devido a particularidades do trabalho médico. Por outro lado, tornou-se necessário acrescentar novos conceitos, de grande importância clínica, não utilizados rotineiramente em técnicas gerenciais de setores não-médicos. O emprego das técnicas de qualidade na utilização do cateter de Swan-Ganz tem particular importância por se tratar de um método que é dispendioso, não é inócuo e cuja indicação clínica freqüentemente tem identificação difícil. As mais diferentes e complexas técnicas de qualidade podem ser teoricamente aplicadas a esse nosso contexto, porém somente algumas foram testadas na prática. Estão descritos, a seguir, os princípios básicos da qualidade em monitorização hemodinâmica, destacando-se os aspectos em que existem evidências de uso vantajoso.
Sob o ponto de vista genérico, existem três itens a se considerar: 1) o controle da qualidade; 2) a garantia da qualidade; e 3) a melhoria da qualidade. O controle de qualidade constitui-se no conjunto de ações que devem ser cumpridas para que uma atividade seja executada segundo padrão definido. A garantia da qualidade constitui-se na verificação de que as ações executadas obedecem ao padrão definido. Finalmente, a garantia da qualidade constitui-se na constante modificação e atualização para aprimoramento desse padrão de trabalho.
O controle de qualidade no manuseio do cateter de Swan-Ganz constitui-se essencialmente num conjunto de descrições que mostra os diversos componentes do processo: 1) quais são as indicações e contra-indicações utilizadas; 2) quais são os cateteres disponíveis para uso; 3) qual a forma de seleção dos cateteres; 4) como é viabilizado seu uso; 5) quem está habilitado para sua inserção; 6) qual a técnica, materiais e equipamentos utilizados; 7) como é a rotina de manutenção e vigilância sobre as complicações; e 8) quais são os critérios para troca ou retirada do cateter. Essas descrições devem estar disponíveis em documento que permita a apreciação de como é praticada aquela atividade dentro da instituição.
A garantia da qualidade inclui basicamente três componentes: 1) treinamento para habilitação; 2) verificação do cumprimento do padrão fornecido pelo controle de qualidade; e 3) monitorização dos índices de qualidade. Os diversos itens relacionados anteriormente para o controle de qualidade devem ter um programa de treinamento que permita a integração de novos elementos na equipe de trabalho, bem como a reciclagem de antigos funcionários. O treinamento deve ser dirigido de forma a caracterizar quais são as responsabilidades e qualificações esperadas de cada grupo profissional para que seja atingida a qualidade desejada. A tarefa de verificação sistemática do cumprimento das normas de controle de qualidade é um item controverso e de difícil execução. A coleta passiva de formulários comunicando o descumprimento de normas é sabidamente ineficaz, conduzindo a falsas interpretações. A coleta contínua e ativa de formulários extensos, que devem ser preenchidos diariamente de todos os casos, também apresenta muitos inconvenientes; sobretudo pela inconstância e inconsistência do preenchimento. A melhor forma de verificação, segundo evidências da literatura já publicada, é a exercida pelo trabalho dirigido e ativo de uma enfermeira epidemiologista; fazendo coleta, processamento e interpretação dos dados selecionados segundo um protocolo que atenda os critérios de pesquisa científica. Os índices de qualidade devem ser os mais simples possíveis, constituindo-se nos únicos itens que serão coletados de todos os casos e de forma ininterrupta. Sempre que possível devemos selecionar os itens que poupem o trabalho de notificação por formulários, coleta extensa de dados ou processos muito complexos. Existem poucos trabalhos publicados abordando esse tema. Mostramos, na Tabela 5, três índices de qualidade praticados no controle do cateter de Swan-Ganz no centro de terapia intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein(32).
A tarefa de melhoria da qualidade pode ser dividida em: 1) atualização dos conhecimentos; e 2) pesquisa aplicada. Devemos dispor de uma forma sistematizada de atualização. Os novos equipamentos e as novas informações devem ser rapidamente detectados, procurando-se incorporar à nossa rotina de trabalho quando evidenciarem benefício inequívoco. Revisões periódicas de bancos de dados médicos com as palavras chaves adequadas fornecem vasto material de pesquisa. A identificação da validade dos modelos e as conclusões dos diversos trabalhos devem criar determinado nível de evidência. Caso o conjunto de evidências seja favorável, estaremos diante de alto grau de recomendação para prática clínica. Em outra parte deste artigo os níveis de evidência e os graus de recomendação encontram-se mais bem detalhados. Quanto à pesquisa aplicada, podemos identificar que muitos aspectos relevantes no uso do cateter de Swan-Ganz ainda não foram estudados adequadamente. A criação de modelos de pesquisa adequados é um dos principais desafios para melhoria da qualidade da monitorização hemodinâmica.

NÍVEIS DE EVIDÊNCIA: BENEFÍCIO E EFETIVIDADE

As publicações relacionadas ao tema choque e hemodinâmica constituem-se freqüentemente em fonte de dados de difícil assimilação, dificultando sua aplicabilidade clínica. Existem diversas formas padronizadas para execução de revisões bibliográficas de temas médicos(33, 34). Os dados descritos a seguir não constituem uma meta-análise. Procuramos apenas revisar alguns temas relevantes, obedecendo a critérios mínimos para tornar as observações mais objetivas. Segue-se, nas Tabelas 6 a 8, a quantificação da qualidade metodológica de trabalhos clínicos, nível de evidência e grau de recomendação(35, 36).
A utilização do cateter de Swan-Ganz tem sido novamente questionada. Anteriormente o questionamento era baseado apenas em opiniões de especialistas, raciocínios fisiopatológicos, ou simples argumentação lógica e racional. A incorporação de bases científicas aos antigos argumentos, sobretudo aqueles gerados pela Medicina Baseada em Evidências, fez renascer as dúvidas sobre o papel do cateter dentro do contexto atual da Medicina intensiva. Existem muitos aspectos que precisam ser considerados, exigindo-se estudo criterioso para evitar falsas interpretações.
O cateter de Swan-Ganz é um sistema de monitorização e não um agente terapêutico. Foi concebido no final dos anos 60 e sua introdução na prática médica foi iniciada em 1970, constituindo-se num dos mais antigos métodos de monitorização ainda utilizados nos centros de terapia intensiva. Foi por meio desse sistema que as mais diferentes doenças graves foram estudadas. Diversas modalidades terapêuticas foram criadas a partir de conhecimentos derivados do uso do cateter de Swan-Ganz. Caso o cateter seja eficiente na detecção de alterações que estejam associadas ao prognóstico dos pacientes e os danos produzidos pelo tratamento somados aos efeitos prejudiciais do próprio cateter não sejam elevados, obteríamos melhores índices de morbi-mortalidade. Se tivermos boas evidências que o cateter de Swan-Ganz reduz a morbi-mortalidade, outra modalidade de monito-rização só seria utilizada se tivesse alguma clara vantagem.
Quais as evidências de melhor prognóstico com o emprego do cateter de Swan-Ganz? Na abordagem dessa questão torna-se necessária a identificação clara de alguns aspectos: 1) qual a população estudada, para não incorrer em generalizações ou particularizações; 2) qual o protocolo de tratamento (normal ou supranormal); e 3) que aspecto prognóstico foi estudado (mortalidade, morbidade/falências orgânicas, tempo de hospitalização, seqüelas a longo prazo/qualidade de vida).
Como já foi citado em outra parte deste texto, uma grande questão a ser respondida é: a terapia supranormal guiada pelo cateter de Swan-Ganz melhora a sobrevida de pacientes críticos(36-38)? Uma revisão da literatura médica revela a existência de três trabalhos abordando o tema, dos quais apenas um tem nível de evidência I, e os outros dois são trabalhos com amostras pequenas (51 e 100 pacientes) e nível de evidência II. Estudos com nível de evidência inferior não estarão sendo objeto de consideração detalhada nesta nossa análise.
Os subgrupos de pacientes críticos estudados até o momento, por meio de trabalhos clínicos controlados e randomizados, foram: pacientes mistos internados em centros de terapia intensiva; idosos vítimas de fratura de fêmur; pacientes hospitalizados para correção eletiva de aneurisma de aorta abdominal; pacientes submetidos a cirurgia para revascularização miocárdica; e pacientes com infarto agudo do miocárdio. A análise dos trabalhos disponíveis no banco de dados MedLine demonstra que não existem, até o momento, trabalhos de boa qualidade, abordando qualquer grupo populacional, em que tenha sido demonstrado benefício, por mais de uma vez, com a terapêutica dirigida com cateter de Swan-Ganz. Os dados encontram-se sumarizados nas Tabelas 9 e 10.
Diversos outros subgrupos de pacientes críticos foram estudados em trabalhos com grupo controle sem randomização ou mesmo sem nenhum grupo controle. Pacientes cirúrgicos de alto risco, portadores de infarto agudo do miocárdio, ou submetidos a cirurgias cardíacas, idosos politraumatizados, queimados, pacientes com síndrome de desconforto respiratório agudo, portadores de pancreatite aguda necro-hemorrágica e pacientes submetidos a aneuris-mectomia de aorta abdominal já foram objeto de estudos com nível de evidência III, IV ou V. É interessante observar que muitos desses estudos, sem evidência de qualidade, são freqüentemente citados em publicações, palestras e discussões beira leito(36), atribuindo-se importância clínica não recomendável.
Como pode-se depreender pela leitura das tabelas, a única evidência de boa qualidade demonstra que a terapêutica supranormal guiada pelo Swan-Ganz não melhora a sobrevida de população geral de pacientes críticos (essa observação ainda não foi replicada)(15), porém nenhum subgrupo de pacientes foi estudado em trabalhos contendo número adequado de observações ou método de qualidade.

A POLÊMICA ATUAL DO SWAN-GANZ: DEVE SER DECRETADA SUA MORATÓRIA?

Desde sua introdução, e com o uso mais disseminado do cateter de Swan-Ganz, alguns autores passaram a questionar sua validade como recurso que pudesse reduzir a mortalidade nos pacientes graves. Em 1987, Robin(39) argumentou que os riscos da cateterização da artéria pulmonar eram maiores que os benefícios. Após realizar estudo retrospectivo de seu uso no infarto agudo do miocárdio, no qual constatou que os pacientes com cateter de Swan-Ganz teriam pior evolução, sugeriu a "moratória" desse cateter. Esse estudo foi muito criticado por ser retrospectivo, e sua opinião foi considerada extremista. No mesmo ano, Gore e colaboradores(40) relataram um estudo, não-randomizado, realizado em 16 centros no Estado de Massachusetts, nos Estados Unidos, que incluiu 3.263 pacientes com infarto agudo do miocárdio, concluindo que o maior índice de mortalidade hospitalar ocorreu naqueles que receberam o cateter de Swan-Ganz. Opinião semelhante foi emitida por Spodick(41), em 1989, que acreditava ser o procedimento deletério ao paciente. Em 1990, Zion e colaboradores(42), analisando o uso do cateter pulmonar em 5.841 pacientes com infarto agudo do miocárdio em 14 unidades coronárias de Israel, concluíram que os 371 pacientes (6,4%) que receberam o cateter de Swan-Ganz tiveram índice de mortalidade maior do que os que não o receberam (59,4% x 33,5%). Os autores, porém, interpretaram esses resultados, justificando que os pacientes que receberam o cateter de Swan-Ganz eram "mais doentes" do que os outros, e essa seria a causa do maior índice de mortalidade entre os mesmos. Naylor e colaboradores(43) também questionaram o uso do cateter de Swan-Ganz, referindo ser um procedimento associado a considerável iatrogenia e a custos elevados.

 

Tabela 2. Complicações potenciais da monitorização hemodinâmica invasiva.

Relacionadas à punção venosa
Punção arterial
Pneumotórax
Lesão do plexo braquial
Síndrome de Horner
Lesão transitória do nervo frênico
Embolia gasosa
Relacionadas à passagem do cateter
Arritmias
Enovelamento
Danos nos sistemas valvares
Perfuração da artéria pulmonar
Relacionadas à presença do cateter na artéria pulmonar
Trombose venosa no local da inserção
Infarto pulmonar
Sepse/endocardite

Tabela 3. Habilidades cognitivas necessárias.

1) Conhecimento das indicações. Os dados obtidos devem nortear decisões terapêuticas e interferir favoravelmente no prognóstico.
2) Conhecimento da anatomia do pescoço, do sistema venoso central, da árvore arterial periférica, do coração e dos pulmões.
3) Conhecimento e habilidade de reconhecer curvas de pressão nas mais variadas indicações.
4) Conhecimento e habilidade de realizar cálculos hemodinâmicos.
5) Habilidade de reconhecer artefatos e situações clínicas em que os dados possam estar falseados (interação com PEEP, alterações de complacência ventricular).
6) Conhecimento de balanço hidroeletrolítico e sua influência na hemodinâmica.
7) Conhecimento farmacológico das drogas que alteram a pré-carga, a pós-carga e o estado inotrópico.
8) Conhecimento das complicações e das técnicas necessárias para minimizá-las.
9) Conhecimento dos múltiplos estados fisiopatológicos e doenças presentes nos doentes graves submetidos a monitorização hemodinâmica.
10) Conhecimentos relacionados a gases arteriais, ventilação pulmonar e anormalidades metabólicas.
11) Habilidade de comunicar e documentar os resultados de exame ao paciente e a outros médicos.

Tabela 4. Exigências técnicas necessárias.

1) Habilidade de realizar técnica cirúrgica estéril.
2) Habilidade de realizar acesso venoso a partir de dois ou mais sítios pela técnica percutânea.
3) Habilidade em prover acesso arterial por punção ou dissecção.
4) Habilidade em operar toda a instrumentação envolvida na monitorização hemodinâmica, incluindo cateteres, introdutores, transdutores, além da calibração e do estabelecimento do "zero".
5) Conhecimento e habilidade para corrigir artefatos comuns e problemas técnicos relacionados à aquisição dos dados.

Tabela 5. Índices de qualidade utilizados no controle do cateter de Swan-Ganz no centro de terapia intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein.

Índice de
qualidade
Fórmula Valor ideal Observações
Taxa de uso Número de cateteres/número de pacientes admitidos no centro de terapia intensiva 5-7% (CTIs Gerais) Permite fazer estimativa de uso futuro e cálculo da demanda de recursos.
Tempo de uso Tempo total de uso/Número de pacientes monitorizados com Swan-Ganz < 60 horas/paciente Executa o controle sobre a principal complicação: infecção por uso prolongado.
Taxa de indicação Número de pacientes monitorizados/número de pacientes usando duas ou mais drogas vasoativas > 50% Permite uma estimativa de qual é a proporção de pacientes que foram monitorizados e os que deveriam ser monitorizados.

 

 

Tabela 6. Qualidade metodológica de trabalhos clínicos.

Características do estudo Escore
População  
Descrição reprodutível,
severidade da doença, comorbidade
5
Intervenção  
O procedimento é explícito
e reprodutível
2
Existe grupo controle 3
Prognóstico (a descrição e a forma
de medir devem ser explícitas e reprodutíveis)
 
Mortalidade 3
Tempo de permanência no centro
de terapia intensiva,
tempo de permanência no hospital
2
Protocolo  
Randomização dos grupos 3
Identificação de co-intervenções 2
Seguimento  
90%-100% 5
80%-89% 3
< 80% 1

Obs.: Pontuação máxima = 25.

Na verdade, sabemos que as iatrogenias são pouco freqüentes quando o procedimento é realizado por um grupo experimentado, e as informações que podem ser obtidas com o cateter de Swan-Ganz suplantam os eventuais aspectos negativos. O mesmo pode-se dizer em relação ao custo, que vem progressivamente sendo reduzido e com benefícios importantes se levarmos em conta as informações fisiopatológicas fornecidas, que podem orientar para uma forma mais racional de tratamento. Porém, até hoje não foram realizados estudos randomizados e com grupo controle que comprovasse a eficácia do cateter de Swan-Ganz. Todas as tentativas nesse sentido esbarravam na dificuldade de se estabelecer um grupo controle onde pacientes graves não receberiam esse recurso, o que sempre foi considerado não-ético.
Recentemente essa polêmica acentuou-se, com a publicação de um artigo de autoria de Connors e colaboradores(44). Essa investigação multicêntrica (estudo prospectivo de "coorte" — observacional, não-randomizado) incluiu 5.735 pacientes críticos com nove categorias de doenças, que foram internados em cinco unidades de tratamento intensivo dos Estados Unidos. Foram comparadas a sobrevida, a permanência no hospital e na unidade de tratamento intensivo, o custo e a intensidade dos cuidados administrados para pacientes que receberam o cateter de Swan-Ganz nas primeiras 24 horas com aqueles que não o receberam. Os cateteres de Swan-Ganz foram utilizados em 2.184 pacientes (38%), que tiveram pior evolução. Foi utilizado um escore ("propensity score", descrito por Rosembaum, em 1983)(44) para ajustar a severidade da doença, representando a relação entre múltiplas co-variáveis e o uso do cateter de Swan-Ganz. Os pacientes que receberam o cateter de Swan-Ganz foram pareados de acordo com diagnóstico comparável e o "propensity score" com os que não receberam o cateter pulmonar. Os resultados da análise pareada demonstraram menor sobrevida e maior utilização de recursos (custos) para os pacientes que receberam o cateter de Swan-Ganz.
Em editorial de autoria de Dalen e Bone(45), os autores valorizaram os achados de Connors e colaboradores e sugeriram a realização de um estudo idealizado de forma adequada, multicêntrico e controlado, do uso do cateter de Swan-Ganz em pacientes graves, ou, caso contrário, que se decretasse a suspensão do emprego dos cateteres de artéria pulmonar, com a recomendação da "moratória" do mesmo pelo FDA. Esses comentários e opiniões emitidos por autores conceituados no campo da Medicina intensiva provocaram reações enérgicas e imediatas de outros profissionais de destaque na área, inclusive com manifestações oficiais da "Society of Critical Care Medicine", nos Estados Unidos.
Na verdade esse estudo é inconclusivo, pois parte de uma revisão retrospectiva de dados coletados com outra finalidade que não a do estudo da cateterização cardíaca direita em pacientes graves. A análise estatística foi realizada em população que não foi escolhida de modo randomizado para esse tipo de conclusão. Ressalte-se ainda que esse estudo reportou-se apenas a pacientes que receberam o cateter de Swan-Ganz nas primeiras 24 horas após a internação, existindo número considerável de pacientes que após sua internação em unidade de tratamento intensivo recebem uma série de avaliações com abordagens não (ou pouco) invasivas nas primeiras 24 horas, sendo posteriormente submetidos a cateterização da artéria pulmonar, se necessário. Por outro lado, apesar de terem sido especificadas categorias de doenças para inclusão no estudo, sabemos que existem serviços que são mais agressivos nessas indicações, enquanto outros são mais conservadores, mesmo seguindo esses critérios. Não estão referidos os controles de qualidade em relação à monitorização hemodinâmica nas cinco unidades de tratamento intensivo que participaram desse estudo.
De qualquer maneira, fica bem evidenciada a necessidade da realização de um estudo prospectivo bem projetado, randomizado e com grupo-controle, que já está sendo encaminhado sob os auspícios da "Society of Critical Care Medicine", dos Estados Unidos.
O que atualmente questionamos é que se realmente existe maior mortalidade com o uso do cateter de Swan-Ganz, esse fato só pode ser decorrente de três aspectos: 1) relacionado à inserção do cateter, que traria uma série de complicações; 2) que os dados e parâmetros advindos de seu uso seriam errôneos e induziriam a terapêutica incorreta; e 3) que a "terapêutica supranormal" fosse a causa de maior mortalidade. Conforme já comentamos, a primeira possibilidade pode ser afastada, enquanto a segunda, se verdadeira, nos levaria a acreditar que todos os conceitos fisiopatológicos e hemodinâmicos que temos atualmente estariam incorretos e portanto deveriam ser revistos, o que achamos muito pouco provável. Finalmente, a terapêutica supranormal poderia eventualmente trazer alterações fisiopatológicas que levassem a mais disfunção orgânica e aumento da mortalidade.
No presente momento existe consenso entre a maioria dos médicos intensivistas que têm experiência com a cateterização cardíaca direita com o cateter de Swan-Ganz, da qual fazemos parte, de que esse procedimento é seguro e efetivo, podendo ser um recurso muito útil para monitorizar e orientar o tratamento de doentes graves. Não devemos, porém, esquecer que o cateter de Swan-Ganz é apenas recurso diagnóstico, e não tratamento(46, 47).

O CATETER DE SWAN-GANZ DEVE SER INDICADO EM TODO PACIENTE DE TERAPIA INTENSIVA? — ABORDAGEM RACIONAL DO PACIENTE GRAVE

A abordagem inicial de qualquer paciente grave, independentemente dos recursos diagnósticos existentes no Serviço, deve ser clínica. Após essa avaliação deve ser traçada estratégia que inclui, obrigatoriamente, a monitorização de parâmetros fisiológicos, que orientarão o tratamento a ser seguido. É nesse momento, ou durante o tratamento, que a indicação da monitorização hemodinâmica "à beira do leito" poderá ser feita. A maioria dos pacientes internados em unidades de tratamento intensivo não necessita de monitorização hemodinâmica especial, quer invasiva ou não-invasiva. A abordagem e o raciocínio clínico continuam a ter papel de destaque nesse tipo de abordagem. A observação clínica da perfusão periférica, a avaliação do nível de consciência, o volume urinário, o controle da pressão arterial, as provas de volume, etc., podem fornecer informações que possibilitam o tratamento inicial de grande parte dos pacientes críticos. A medida da PVC pode, em certas situações, orientar a reposição volêmica no início do tratamento, estimando a pressão capilar pulmonar sem o uso do cateter de Swan-Ganz(48). Quando essa abordagem for insuficiente, devemos utilizar recursos que propiciem o conhecimento mais detalhado de parâmetros necessários para a otimização do transporte e o consumo de oxigênio pelos tecidos.
Nas condições clínicas em que existe hipoperfusão, a prioridade no tratamento deve ser dirigida para o incremento no transporte de oxigênio. Esse objetivo pode ser alcançado com o aumento de qualquer um de seus três componentes (concentração de oxigênio, concentração de hemoglobina e fluxo sanguíneo), ou com qualquer combinação dos três.
O aumento do débito cardíaco é considerado o mais crítico dos componentes. Sua otimização é obtida, via de regra, ajustando-se os volumes intravasculares de forma a manter pré-carga ideal. A monitorização hemodinâmica com o cateter de Swan-Ganz pelo conhecimento das pressões de enchimento ventricular fornece estimativa dessa pré-carga (definida como volume). É, porém, no doente grave submetido a freqüentes alterações da complacência ventricular que a estimativa de volume diastólico final mediante pressão pode não refletir a realidade(49).

Tabela 7. Níveis de evidência em trabalhos clínicos.

Características do estudo Nível de evidência
Estudo randomizado, com grande população (~1.000) e resultados claros
Baixo risco de falso positivo (erro alfa) ou falso negativo (erro beta)
I
Estudo randomizado, com população pequena (~100), com resultados incertos
Risco de moderado a alto de falso positivo (erro alfa) ou falso negativo (erro beta)
II
Estudo não-randomizado
Controles contemporâneos
III
Estudo não-randomizado
Controles históricos
IV
Estudo de série de casos
Sem controles
V

 

Tabela 8. Graus de recomendação para a prática clínica.

Conjunto de evidências   Grau de recomendação
Sugerido por pelo menos dois estudos de nível I   A
Sugerido apenas por um estudo de nível I   B
Sugerido apenas por estudos de nível II ou inferior   C
Sugerido por pelo menos um estudo de nível III   D
Sem evidência clínica de qualidade   Sem graduação

 

O perfil hemodinâmico do doente grave é marcado por desequilíbrio entre oferta e demanda de oxigênio, podendo advir o metabolismo anaeróbico. A judiciosa administração de fluidos, guiada por monitorização confiável, é, portanto, mandatória, especialmente na presença da acidose láctica. Como a acidose láctica é conseqüência do metabolismo anaeróbico, foi postulado que aumentos induzidos no consumo de oxigênio (VO2) em resposta ao incremento no transporte de oxigênio (DO2) com a administração de fluidos indicariam a presença de déficit de oxigênio, que estaria sendo parcialmente satisfeito(31, 50). Isso caracterizaria a tão polêmica dependência patológica de oxigênio no doente grave. Esse fato exigiu do médico intensivista, durante uma década, a persistência na administração de volume e/ou drogas, especialmente nos portadores de acidose láctica, com o objetivo de atingir níveis de transporte de O2 que resultassem em platô de consumo de O2, ou seja, aumentos ulteriores de transporte não se acompanhariam de aumentos no consumo, sugerindo a "satisfação" das necessidades metabólicas.
Essa visão foi progressivamente alterada nos últimos anos por diversos motivos. A presença de variáveis comuns ao transporte e ao consumo de oxigênio caracterizaria o acoplamento matemático, o que inviabilizaria a propalada dependência patológica de oxigênio. Outros postularam que essa dependência poderia ser fruto de variações espontâneas de DO2 e VO2(51, 52). Observações recentes(53, 54) não confirmaram a assim chamada dependência patológica quando se determina o consumo de oxigênio por mensuração direta (calorimetria indireta).
A abordagem lógica seria aquela que assumimos na última década, em que priorizamos a terapêutica do "suficiente" em detrimento da otimização progressiva do transporte de oxigênio, como fizemos no passado. A literatura e a nossa própria experiência nos autorizam a monitorizar o doente grave de forma a guiar com mais precisão a eventual reposição volêmica e, dessa maneira, otimizar o transporte de oxigênio suficiente para reduzir a acidose láctica e atender à demanda metabólica.

PERSPECTIVAS

No ano de 1990 foi introduzido, na prática médica, um novo tipo de cateter pulmonar, que permitiu medir continuamente o débito cardíaco por termodiluição e a oximetria venosa mista, por análise espectrofotométrica(55).
O princípio teórico de se medir o débito cardíaco de forma contínua existe desde 1970, tendo sido enunciado conjuntamente com o lançamento do cateter de Swan-Ganz tradicional. A teoria da medida contínua do débito cardíaco baseia-se no mesmo princípio da termodiluição, utilizando-se de aquecimento ao invés de resfriamento. Em 1984 foram construídos os primeiros monitores computadorizados capacitados a medir mínimas variações de temperatura sanguínea. Somente em 1989 foram concebidos os cateteres pulmonares de resposta rápida, que podem determinar as variações de temperatura a intervalos de até um centésimo de segundo e que, portanto, poderiam registrar variações de temperatura sanguínea a cada batimento cardíaco. Foi colocado nos cateteres pulmonares de resposta rápida um filamento metálico que emite calor de forma programada, e os monitores computadorizados foram equipados com programas estocásticos para interpretar variações de temperatura. Essa associação permitiu a leitura contínua do débito cardíaco.

Tabela 9. Resumo dos trabalhos clínicos prospectivos randomizados controlados com nível de evidência I ou II, abordando terapêutica guiada pelo cateter de Swan-Ganz.

Autor Níveis
de
evidência
Valores Protocolo População
Gattinoni e cols.(15) I 23 Prospectivo, randomizado,controlado,
multicêntrico críticos,
APS > 11
762 pacientes
Body e cols.(13) II 22 Prospectivo, randomizado, controlado 107 cirúrgicos de alto risco
Bishop e cols.(6) II 21 Prospectivo, randomizado, controlado 115 com trauma, ISS ~23
Fleming e cols.(18) II 25 Prospectivo, randomizado, controlado 67 com trauma, ISS ~27
Hayes e cols.(19) II 23 Prospectivo, randomizado, controlado 100 pacientes críticos,Apache II ~18
Yu e cols.(16) II 20 Prospectivo, randomizado, controlado 67 pacientes cirúrgicos, sepse, choque séptico, SARA, choque hipovolêmico
Yu e cols.(38) II 23 Prospectivo, randomizado, controlado 89 pacientes cirúrgicos, sepse, choque séptico, SARA, choque hipovolêmico
Tuchsmidt e cols.(17) II 23 Prospectivo, randomizado, controlado 51 pacientes críticos, choque séptico Apache II ~21

 

(continuação)

 

Autor Intervenção Prognóstico Resultados
Gattinoni e cols.(15) IC > 4,5 l/min.m²
volume + inotrópicos
Falências orgânicas,
tempo de CTI
Não houve melhora no prognóstico
Body e cols.(13) Pré-operatório VO2 > 600 ml/min.m² volume + inotrópicos Mortalidade no PO/tempo no CTI/tempo no hospital Menor mortalidade
Menor taxa de complicações
Bishop e cols.(6) IC > 4,5 l/min.m²
IDO2 > 670 ml/min.m²
IVO2 > 166 ml/min.m²
Mortalidade/falências/
tempo no CTI/tempo no
hospital/uso de respirador
Menor mortalidade Menor número de falências
Tempo e respirador iguais
Fleming e cols.(18) IC > 4,5 l/min.m²
IDO2 > 670 ml/min.m²
IVO2 > 166 ml/min.m²
volume + inotrópicos
Mortalidade, falências orgânicas Menor mortalidade Menor número de falências
Menor tempo no CTI
Menor uso de respirador
Hayes e cols.(19) IC > 4,5 l/ min.m²
IDO2 > 670 ml/min.m²
IVO2 > 170 ml/min.m²
volume + inotrópicos
Mortalidade/tempo no CTI/tempo no hospital Maior mortalidade
Sem diferença nos tempos
Yu e cols.(16) IDO2 > 600 ml/min.m²
volume + inotrópicos
Mortalidade/tempo no CTI/tempo no hospital Sem diferenças
Yu e cols.(38) IDO2 > 600 ml/min.m²
volume + inotrópicos
Mortalidade de causa cardíaca/ falências orgânicas/tempo no CTI/tempo no hospital Sem diferenças
Tuchsmidt e cols.(17) IC > 6 l/min.m²
volume + inotrópicos
Mortalidade/tempo no CTI Sem diferenças

APS = "acute physiological score", Apache = "Acute Physiologic and Chronic Health Evaluation", SARA = síndrome de angústia respiratória do adulto, IC = índice cardíaco, VO2 = consumo de oxigênio, IVO2 = índice de consumo de oxigênio, DO2 = transporte de oxigênio, IDO2 = índice de transporte de oxigênio, CTI = centro de terapia intensiva, PO = pós-operatório.

Na época em que foram lançados os primeiros cateteres para leitura contínua do débito cardíaco, a prática clínica já se preocupava com os parâmetros de oxigenação. A introdução de sistemas de oximetria intravascular contínua nos cateteres foi rapidamente interpretada como implementação útil. Como a técnica já se encontrava disponível, surgiram então os atuais cateteres de leitura contínua do débito cardíaco e leitura contínua da oximetria venosa mista. As características gerais desse equipamento são muito semelhantes às de um Swan-Ganz comum. As diferenças constituem-se em dois cabos adicionais, que servem para leitura da oximetria e para produzir o aquecimento do filamento metálico. O diâmetro mínimo do cateter é de 7,5 F e obriga o uso de um introdutor de 8,0 F. A técnica de introdução é a mesma. O preço do cateter convencional é de cerca de US$ 80 e do cateter novo, em torno de US$ 180.
A análise de segurança de uso do equipamento encontra-se bem estabelecida em modelos animais. O filamento metálico, que é constituído de cobre, tem revestimento siliconizado, de forma a impedir intoxicação por esse metal. É possível a realização de medidas do débito cardíaco numa faixa de temperatura sanguínea entre 32oC e 40oC. Como era esperado, a leitura do débito fica progressivamente imprecisa em temperaturas maiores, ao contrário do que acontece no sistema convencional. O aquecimento produzido pelo filamento de cobre atinge temperaturas de 0,8oC a 1,0oC acima da temperatura sanguínea. Em estudos animais, o aquecimento produzido pelo sistema não induziu hemólise ou dano endotelial. Cardioversões elétricas em animais de grande porte não produziram lesões cardiovasculares.

Tabela 10. Resumo das recomendações de uso do cateter de Swan-Ganz — nível de evidência e grau de recomendação.

População Recomendação Nível
de
evidência
Grau de
recomendação
Pacientes críticos Terapia guiada não melhora o prognóstico I B
Pacientes críticos Uso de monitorização piora o prognóstico V -
Pacientes cirúrgicos de alto risco Otimização pré-operatória guiada por Swan-Ganz melhora a mortalidade II C
Fratura de fêmur em idosos Monitorização peri-operatória melhora a mortalidade II C
Cirurgias vasculares
— Aneurismectomia abdominal eletiva
— Operação salvadora de membros

Monitorização peri-operatória não melhora o prognóstico
Otimização pré-operatória melhora o prognóstico

II

II

C

C
Revascularização miocárdica Monitorização não melhora o prognóstico, mesmo nos pacientes de maior risco III D
Pacientes críticos/ revascularização miocárdica O uso de cateteres com oximetria não reduz custos nem o número de medidas do débito cardíaco II C
Infarto agudo do miocárdio Uso do Swan-Ganz não piora o prognóstico dos pacientes com insuficiência cardíaca III D

Em humanos, a bibliografia disponível no banco de dados MedLine demonstra a comparação entre os métodos convencional e contínuo em seis pequenas séries de pacientes. Todos os estudos concluem pela boa correlação do método contínuo em relação ao método em bolus, este último considerado como "gold standard". Em um dos estudos houve maior dificuldade para se posicionar o cateter de débito contínuo em comparação com o cateter convencional, fato de difícil interpretação, pois o dois cateteres têm as mesmas características gerais.
Duas características desse novo cateter fizeram com que fosse adotado no centro de terapia intensiva do Hospital Israelita Albert Einstein como de uso preferencial: 1) a possibilidade de monitorização contínua; e 2) a abolição do uso de bolus de soro glicosado, que é um dos principais fatores de risco para infecção.
O avanço técnico nos coloca diante de nova perspectiva. A monitorização contínua de variáveis hemodinâmicas e de oxigenação permite a detecção mais precoce das alterações, induzindo a intervenções mais freqüentes. As futuras pesquisas sobre o impacto da terapia guiada pelo cateter de Swan-Ganz no prognóstico de doenças graves deverão utilizar formas de monitorização contínua.

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